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Limoeiro no sábado-feira – cultura e curiosidades

A PRAÇA não é a mesma, tampouco os bancos e flores, até porque não tem jardim, mas quem quer saber um punhado da história de Limoeiro do Norte basta dar uma volta por algumas de suas principais ruas, ou a avenida Dom Aureliano e suas secundárias. É o CORAÇÃO do comércio citadino, interiorano, popular. Novo e antigo convivem, se não tão amigáveis, pelo menos resistindo um ao outro. De modernas lojas a camelôs, ao lado de bares e mercearias que ultrapassam o meio século, menos para lucrar e mais para manter a tradição familiar.

“VAI AÍ, freguês, uma camisa aí. Tá bem baratinho, de promoção. De R$ 8,90!”, diz um vendedor ambulante na praça da Coluna da Hora. Lá tem de tudo: roupa, calçados, brinquedos, bebidas, imagens de santo, fotos de artista de novela, CD e DVD (geralmente piratas); até linha de pesca, querosene e couro fresquinho de boi. É Limoeiro nas manhãs de sábado. Enquanto o sol vai nascendo, vem pau-de-arara de tudo que é canto: o povo da zona rural para fazer a feira. E gente vai, gente vem, o povo cansa; compra um suco de maracujá (“bom para quem tem pressão alta”, disseram-me) e uma coxinha recheada de carne moída, “que o almoço hoje é tarde”. As lojas grandes alugam carros de som, estrondando as “promoções da semana”; as médias e clubes de festa “alugam” Zé de Nega, o maior publicitário popular, com seu carrinho de som (picossom) falando ao microfone; os comerciantes pequenos, mas pequenos mesmo, feito camelôs, vão no gogó com o discurso de tão repetido que parece gravação: “Vai aí, freguês, uma camisa aí. Tá bem baratinho…”. E por aí vai. A sedutora palavra-chave é “PROMOÇÃO”.
“MUITOS CAMELÔS surgiram quando reformaram o Mercado Central, não tinham para onde ficar e se instalaram por lá”, explica Washington de Lima, filho de seu Jeová de Lima, falecido dono da não menos “Casa Lima”, uma antiga mercearia que existe em frente à COLUNA DA HORA. Lá se vende de quase tudo um pouco, de pirulito a panela de alumínio, passando por cadeado e linha de pesca. Não tem fachada ou marquise denunciando a existência daquele comércio – não precisa. Aliás, os comércios mais antigos de Limoeiro não têm nome e, ainda assim, são os mais conhecidos. Quem não conhece Chavier sapateiro, do “bequinho estreito” ? Todos os dias e há mais de 35 anos fazendo e consertando sapato, sandalha, chinelo, fazendo os pés do limoeirense e com a vantagem de ter poucos como ele no ramo. Nem precisa de pintura na entrada para avisar que ‘Biel’ está lá.
NESSE TEMPO todo, tem gente que lucrou e cresceu, gente que ficou estagnada. Tem seu Zé Dino, exemplo de empreendedor de sucesso. Vendia em sua bicicleta, hoje vende de bicicleta a TV LCD. Tem também o já ‘mercantil’ de Raimundo Aleijado, mas que de tão antigo ainda tem cheiro de bodega.
E QUEM não já ouviu os batuques no BAR de Guilherme Vieira? Existe há 40 anos e já teve dezenas de donos, mas não tem errada: Em todo sábado, desses anos todos, lá está Cristalino Brandão, 74 e, diz ele, pelo menos 54 anos de sanfona. Dizem que é o sanfoneiro mais antigo de Limoeiro. O forró-pé-de-serra só não dura mais que a bebida no copo, constantemente renovada. No bar tem desde o rapaz carregador de carvão, que acabou de despachar o serviço, a empresário, como seu Galdêncio Roque, que até dá uma palhinha de sanfona na sua bandinha de estranho nome “Toxinordestino”.
E nesse vai e vem de uma manhã de SÁBADO, sol quente na cabeça, é só chamar o carrinho de picolé da Jaguari Kibom. O calor é tão grande que é o jeito vendedor virar freguês, chupando do próprio picolé para esfriar até a alma.
PASSANDO pela Coluna da Hora, dá até vontade de se deitar numa daquelas redes penduradas na Casa Holanda. Este um dos comércios mais antigos mesmo: 75 anos sempre vendendo tecidos.
Acho que o comércio antigo tem que se atualizar um pouco, se não vai ser engolido pelo ‘comércio moderno’”, afirma seu Antônio Zeudo, proprietário, que reclama indignado do empréstimo consignado, aquele em que os bancos fazem a farra com os aposentados. Desse jeito, freguês antigo nem aparece para comprar, de tanto empréstimo que tem para pagar. Hoje, a Casa Holanda vende até imagem de santo. Pelo milagre da venda! Mas seu Antônio sentencia: “a gente não tem isso como fonte de renda, mas para continuar a atividade, manter a tradição”.
Acostumados ao suor na testa, moedas no bolso e sorriso banguela, os limoeirenses passantes nas feiras do sábado nem percebem, mas estão a costumados a manter vivo o “Limoeiro antigo”. E a fazer história.
 Foto: Melquíades Júnior
Repórter: Melquíades Júnior
Fonte: Diário do Vale do Jaguaribe